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Em 2009 fui diagnosticado com uma doença do neurônio motor (DNM) Trata-se de uma doença neuromuscular, progressiva, degenerativa e sem cura. Mesmo assim insisto que vale a pena viver e lutar para que pesquisas, tratamentos paliativos, novos tratamentos cheguem ao Brasil no tempo + breve possível, alem do respeito no cumprimento dos nossos direitos. .

23 de fev. de 2012

ELA : Quase 2 séculos de história - Parte I

                                                            Dr. Jean Martin Charcot

Por Antonio Jorge de Melo




Sir Charles Bell, um famoso anatomista e cirurgião britânico, relacionou as raízes nervosas com movimento. Em 1830, ele descreveu uma mulher, de meia idade, com paralisia progressiva dos membros e da língua, com sensibilidade normal. Ao estudo anátomo-patológico verificou-se que a porção anterior da medula encontrava-se amolecida, com preservação da porção posterior.

Em 1848, François Aran, um famoso clínico e escritor médico francês, descreveu uma nova síndrome, denominada de Atrofia Muscular Progressiva (AMP), caracterizada por fraqueza muscular progressiva de natureza neurogênica.

Em 1869, Jean Martin Charcot, o primeiro professor de neurologia na Salpêtrière, e Joffroy descreveram dois pacientes com AMP com lesões associadas na porção póstero-lateral da medula nervosa. Eles não deram o nome de Esclerose Lateral Amiotrófica (ELA) para esta entidade, mas eles determinaram as características essenciais para o seu reconhecimento, desde então pouco modificadas. As descricões subseqüentes basearam-se em estudos em pacientes do sexo feminino, em sua maioria, uma vez que o Hospital Salpêtrière era umhospital de mulher.

Também coube a Charcot a descrição de Paralisia Bulbar Progressiva (PBP) e de Esclerose Lateral Primária (ELP), mas ele considerava estas duas entidades separadas da Esclerose Lateral Amiotrófica. Entretanto, outros médicos, também famosos, como Leyden e Gowers, insistiam que estas afecções não eram distintas uma das outras. Em 1933, Brain introduziu o termo Doença do Neurônio Motor para todas estas, aparentemente, diferentes doenças. Em 1969, Brain e Walton consideraram DNM e ELA como sinônimos, embora o termo ELA seja o mais freqüentemente utilizado.

A primeira descrição da esclerose lateral amiotrófica no Brasil coube ao Dr. Cyprianode Souza Freitas, professor de anatomia e fisiologia patológica da Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro. Conhecedor na época de quatro casos de ELA. Escolheu para apresentar no IVCongresso Médico Latino Americano na cidade do Rio de Janeiro em agosto 1909, observações e comentários sobre um caso de ELA e em novembro do mesmo ano publicou no Brazil-Médico com o título “Sobre um caso de esclerose lateral amyotrophica”, um caso clínico definido por ele como assas interessante, pela:

1) Raridade da afecção entre nós;

2) Idade de início dos sintomas;

3) Dificuldade de formular, desde o começo, um diagnóstico preciso, assumindo os fenômenos de uma forma frustra, bem diversa da forma clássica.

 Revista Neurociências V14 N2 (supl-versão eletrônica) –abr/jun, 2006.

 Tratava-se de paciente do sexo masculino, branco, 73 anos de idade, sem antecedentes hereditários dignos de referência. Trabalhava em especulações financeiras e praticava atividade física sendo definido como “bom andador”. Começou a sentir ligeiro enfraquecimento da mão direita, sobretudo dos dedos. A fraqueza evoluiu gradualmente acompanhada de atrofia dos músculos da mão. Examinado quatro meses após o início dos sintomas, apresentava paresia bem acentuada do membro superior direito. Atrofia muitíssimo acentuada na região tenar e acentuada na região hipotenar e dos interósseos. Apresentava também atrofia na musculatura do antebraço, braço e cintura escapular, fasciculação nas regiões atrofiadas, leve espasticidade e movimentos espasmódicos nas mãos. A musculatura do membro superior direito, da face, pescoço, tronco, e membros inferiores estava íntegra e com força normal. O reflexo estava vivo no membro afetado e normal nos outros segmentos. A sensibilidade estava normal em todo o corpo. Os sentidos intactos, inteligência perfeita, sem dificuldade para comer e digerir e função esfincteriana normal.

Reavaliado, três meses mais tarde, apresentava atrofia nos músculos da mão esquerda com presença de fasciculação, sensibilidade normal e reflexos ora se mostravam vivos tanto nos membros superiores como os patelares, mas sem sinal de Babinski. Referiu que as vezes tinha embaraço na pronúncia das palavras. Ao exame apresentava os movimentos de lábios e língua perfeitos, véu do palato simétrico, reflexo faríngeo normal, porém o reflexo masseterino estava vivo. Um mês mais tarde, sofreu um forte ataque de gripe e ficou acamado por muitos dias. Após a recuperação da gripe, apresentava agravamento dos sintomas da ELA, com aparecimento de atrofia nos músculos do tronco e paresia nos membros inferiores, reflexos patelares exaltados (maior à direta), continuando a ausência do sinal de Babinski. Apareceram também dificuldade para deglutir, fasciculação de língua, impossibilidade de assobiar, insuficiência respiratória e acessos de sufocação, sobretudo a noite.

 O período de avaliação foi de oito meses, de janeiro a agosto de 1909. Após a primeira avaliação clínica, o Dr. Cypriano confirma o diagnóstico de ELA com o seguinte comentário:

“a vista da amiotrofia e da insignificância dos fenômenos espásticos, que exigem procurados, poder-se-ia supor que nos achávamos diante de um caso de atrofia muscular do tipo Aran-Duchenne. Mas, atendendo que a paresia não guardava relação com a atrofia e, sobretudo..." (Revista Neurociências V14 N2 (supl-versão eletrônica) –abr/jun, 2006).

A partir da descrição do Dr. Cypriano Freitas, vários casos foram registrados na literatura médica nacional que contribuíram para o conhecimento da manifestação da ELA em nosso meio. Em julho de 1913, Eduardo Monteiro, apresentou “um caso de esclerose lateral amyotrophica” na Gazeta Clínica de São Paulo onde registra que o início da afecção se deu no membro superior direito.

O Dr. Aloysio de Castro, professor de clínica médica da Universidade do Rio de Janeiro. Publicou, em 1914, o “Tractado de Semiótica Nervosa” que apresenta a descrição da Esclerose Lateral Amyotróphica (Mal de Charcot).

Em 1915, o Dr. Gonçalves Vianna escreveu suas observações “A respeito de um caso de Mal de Charcot (Typo Mixto)”, na Revista dos Cursos da Faculdade de Medicina de Porto Alegre.

Nos EUA Lou Gehrig foi um famoso atleta americano, jogador de beisebol. Iniciou sua carreira aos 20 anos de idade em 1923. Era conhecido como “Iron Horse” mas em 1939, seu desempenho começou a cair e foi detectada uma discreta fraqueza nos membros inferiores e uma leve atrofia do primeiro interósseo dorsal. Em 13 de junho deste mesmo ano foi diagnosticada ELA. Lou Gehrig foi, então, impedido de jogar beisebol para conservar sua energia muscular.

Veio a falecer no dia 2 de junho de 1941, dormindo, já não podia mais falar ou engolir. Desde então, por sua história de vida ter sido interrompida por ELA, ele teve seu nome associado a doença.

Os estudos epidemiológicos aparecem na literatura médica nacional somente a partir da década de 1980. Até o momento atual foram realizados seis estudos epidemiológicos regionais e um estudo nacional, conforme apresentamos a seguir.

               http://www.revistaneurociencias.com.br/edicoes/2006/